Quando estou no trabalho e nao tenho nada que fazer, costumo "folhear" os jornais portugueses e espanhóis, para ver o que se passa pelo mundo fora. Leio os portugueses, porque sao a minha única fonte de informaçao que tenho sobre Portugal desde há um ano e dois meses. Aparte dos escândalos do costume, e de concluir tristemente que a melhor decisao da minha vida foi, efectivamente, vir para Espanha, por vezes deparo-me com notícias que me poem mesmo de lágrimas nos olhos.
Uma dessas notícias, perdida pelo meio de Casas Pias, pedófilias, e famílias que sobrevivem (alegremente?!) com 400 euros por mês, foi a que anuncia o fecho do cinema Medeia King, que agora parece que alberga o parque de estacionamento subterrâneo do Hotel Lutécia.
Considerando que há crianças a morrer à fome e gente que morre todos os dias em atentados idiotas, há que se ter em perspectiva as coisas. E, a perspectiva que me move agora, é aquela que se refere ao facto de que Lisboa está a mudar demasiado depressa e, a partir da distância a que a vejo, para pior.
Nao me posso considerar uma "grande cinéfila"; seria mais uma "mediana melómana", que nao podia ir a concertos em Lisboa porque os bilhetes eram taxados a peso de ouro. O meu gosto por ir ao cinema normalmente choca com a minha inércia natural, que me impede muitas vezes de ter energia para mexer o rabo do sofá e ir ver um filme. Nao sou de ir ver banhadas americanas, embora por uma questao infantil, até curtisse ver o "Transformers". Gosto de ver filmes europeus, apesar de há duas horas atrás, ter estado a ler um artigo na Wikipedia sobre a Nouvelle Vague, um movimento que desconheço, apesar de o nome ser mais que famoso.
Aprecio a arte como uma pessoa que o faz por prazer, e quando pode e quer. E, sem analisar demasiado o cinema ou nao poder viver sem ele, o King tinha muita importancia para mim.
Quando penso no cinema King, penso numa escola de cultura. Mais, penso numa pequena bolha de oxigénio, de onde excluo os pseudos de sempre, e me vejo rodeada de mentes semelhantes, onde ver um filme sempre foi muito mais do que isso. Ir ao King era um acto de coragem perante a mentalidade mediana e medíocre geral, e quando consegui por uns tempos que as minhas segundas-feiras à tarde fosse rotineiramente passadas ali, sentia-me bem.
Lembro-me de ter uma motivaçao para perder 40 minutos em autocarros e no metro para ir ao centro (desgastado e vazio) de Lisboa. Passava por aquela Assírio e Alvim só para comprar livros de poesia a mil paus. Poderia definir esses momentos como "um prazer", embora nao o reconhecesse assim por essa palavra, naquela altura.
E, com isto, prova-se o que já sei aqui dentro: nao volto a Lisboa, porque esta já nao é a minha cidade. Fico deprimida quando me inteiro do que se passa por lá. E que, estar aqui a bem ou a mal, foi uma escolha inteligente, embora me tenha custado emocional e psicologicamente.
Alegre "mileurista", com um grupo de amigos multicultural, com uma cinemateca a cinco minutos a pé de casa, cuja sala é igual ao cine-teatro do Monumental. Na semana passada, concerto de Rufus Wainwright em Cartagena, e esta semana, de Josh Rouse em Murcia City, por um preço justo.
E com um peso no coraçao porque me deram cabo de (mais) uma recordaçao de adolescencia.
A sério, até tenho medo de ir a Lisboa ver a minha família, por causa do choque cultural. Já nao tenho, isso sim, é medo de fazer as devidas comparaçoes e ser completamente anti-patriota.
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