Que digo eu?
Passo todo este dia em silêncio, entrecortado com o zumbir do ar condicionado e do computador, os meus ocasionais passos, o autoclismo a descarregar, o vento lá fora que vai entreabrindo a porta, e uns carros quaisquer que passam na estrada aqui ao lado. O silêncio é humano aqui, porque as máquinas falam demais. E é muito curioso como o silêncio, no fim de contas, revela todo o tipo de sons nos quais normalmente ninguém repara.
O silêncio é humano. Para tudo o resto, isso nao existe.
Fará hoje sensivelmente um ano e um mês desde que publiquei o meu último post. E, muito embora ainda me faça uma enorme confusao pensar que sou “lida”, a verdade é que muitas vezes quis parar para escrever e publicar, nem que fosse a coisa mais parva que alguma vez escrevi na minha vida – vide os dois parágrafos acima; nao serao os mais parvo, mas pelo menos pode-se ler na legenda: “tenho de começar por algum lado e, portanto, vou inventar.”. Só que este último ano foi muito movimentado, e por muito que tivesse imensas coisas para dizer, o facto é que as circunstâncias nao mo permitiram. Aliás, já é bom ainda conseguir ser minimamente fluente na escrita em português, os meus dias normalmente passam-se em espanhol e em inglês, portanto suponho que algumas calinadas na minha língua de Camoes poderao ser perdoadas...
É claro que podia escrever sobre o percurso todo, desde o dia em que me meti no carro e viajei durante 12 horas para aqui, até ao preciso instante em que abri um documento word no dia 9 de Setembro de 2007 e comecei a escrever este rascunho. No entanto, acho que nao vale a pena. Os fios das situaçoes desvelar-se-ao à medida que vá publicando, e por outro lado, evito aborrecer-me de morte a escrever um post de 30 mil páginas sobre um ano de vida em Espanha, além do que isso faz-me dores de cabeça. Compilar 365 dias de informaçao na mente em duas horitas é tao mau como fazer exames de Economia, depois de 3 semanas de explicaçoes intensivas. O que, curiosamente, será a minha última recordaçao de Portugal, embora depois disso outro ano tenha passado.
Discorrendo: fará hoje um ano desde o meu último post. E hoje estou a sentir-me como se estivesse dentro de uma bolha – “inside-a-bubble day”.
Factos: hoje é sábado e estou a trabalhar. Nao vou falar sobre o meu trabalho; é um trabalho corporate, solitário, que pode induzir à depressao e que, muito embora envolva em certos momentos muita comunicaçao gratificante com pessoas, essa comunicaçao costuma ser repetitiva. Ponto final.
Factos: dormi quatro horas na noite passada e estou aqui a funcionar à base de cafés – costumam ser cinco ao dia – porque ontem vieram cá tocar os X-Wife num concerto gratuito.
Confesso que os X-Wife nao sao precisamente a minha banda preferida. Quer dizer, simpatizo com eles, gosto da música, gosto dos sets do Kitten, mas nunca me vi envolvida naquela “movida” toda do revivalismo dos 80 e afins. Oiço, gosto, tenho os álbuns, mas nao sou faaaaaaaaaa. No entanto, dado a situaçao de viver a 1000 quilómetros de Portugal, de os X-Wife serem a única banda portuguesa no festival (e nao me lixem porque eu continuo a nao suportar rock espanhol...) e de o concerto ser à borla, mais um bocadinho de saudades de certas coisas porreiras de Lisboa, lá me enchi de coragem e fui. All Stars vermelhos, coleira de picos e uma pinta betinha negligée, e de balde de vinho com coca cola.
A qualidade do concerto, comparada com a das “celebridades” espanholas, surpreendeu-me muito e fez-me sentir bastante orgulhosa. E – será possível?! – ver ali os meus compatriotas em palco a rasgar até me pôs mais ou menos de lágrimas nos olhos... que piroso!
O que nao me fez sentir nada orgulhosa, e na verdade quase que soltou a peixeira que há em mim, foi um grupo de bimbas-tipo-concerto-do-tony-carreira-versao-spanish que se pôs nas grades, defronte do palco, a gritar completamente histéricas, quase a saltar a vedaçao para os ir violar. Nao, a sério, uma delas devia ser mae de filhos e tudo. Nem quero pensar o que seria se isto fosse num concerto do David Bisbal ou num concerto de reuniao dos Take That... além do que, no presente contexto, é surrealista.
E, em quatro ou seis horas, passei dos X-Wife para o silêncio de um escritório solitário, onde sou a única pessoa presente.
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